O que é a reforma tributária e quais mudanças são discutidas no Congresso?
A reforma tributária ganhou destaque no noticiário nacional com a troca de governo. Há um entendimento quase unânime de que existe a necessidade de mudança no sistema tributário do país, que é complexo e onera demasiadamente o setor produtivo.
A reforma tributária nada mais é do que uma proposta de alteração das leis que determinam os impostos e tributos que devem ser pagos pelos contribuintes, assim como a sua forma de cobrança em todo o território nacional. Embora haja consenso de que essas normas devem ser revistas, a dificuldade surge quando as mudanças começam a ser discutidas na prática.
Atualmente, estão em tramitação duas Propostas de Emenda da Constituição (PECs) que abordam com detalhamento este tema, são elas: a PEC 45/2019, que tramita na Câmara dos Deputados, e a PEC 110/2019, no Senado Federal.
Quais os objetivos da reforma tributária?
O objetivo das propostas é tornar o sistema tributário mais transparente e simplificar o processo de arrecadação sobre a produção e a comercialização de bens e a prestação de serviços, base tributável atualmente compartilhada pela União, estados, Distrito Federal e municípios. Com a mudança, os especialistas esperam que a economia seja estimulada, gerando impactos positivos na produtividade e no consumo.
Quais mudanças estão previstas na reforma tributária?
As duas PECs sugerem a extinção de uma série de impostos, consolidando as bases tributáveis em dois novos tributos: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e o Imposto Seletivo.
O Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), segue o modelo dos Impostos sobre Valor Agregado (IVA) cobrados na maioria dos países desenvolvidos. Como o IVA, o novo tributo não é cumulativo, ou seja, não incide em cascata em cada etapa da produção.
A base de incidência do IBS em ambas as propostas é praticamente igual: todos os bens e serviços, incluindo a exploração de bens e direitos, tangíveis e intangíveis, e a locação de bens, operações que, em regra, escapam da tributação do ICMS estadual e do ISS municipal na norma atualmente em vigor.
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No entanto, as propostas têm divergências significativas em relação à determinação da alíquota, ao número de tributos substituídos, a concessão de benefícios fiscais, partilha da arrecadação do IBS, a competência tributária, a vinculação da arrecadação e as transições de sistema de cobrança de tributos e de partilha de recursos.
A reforma tributária da PEC 110/2019 e o IBS
De acordo a PEC 110/2019, a proposta que tramita no Senado, o IBS é um tributo estadual, a ser instituído por intermédio do Congresso Nacional. A PEC prevê que o novo imposto faça a substituição de nove tributos, são eles:
Além disso, a proposta determina que a alíquota do imposto a ser cobrada será padrão, mas poderão ser fixadas alíquotas diferenciadas em relação à padrão para determinados bens ou serviços. Sendo assim, a alíquota pode diferir, dependendo do que está sendo taxado, mas é aplicada de maneira uniforme em todo o país.
A PEC 110/2019 determina que a arrecadação do imposto é partilhada entre União, estados, Distrito Federal e municípios mediante entrega de recursos a cada ente federativo conforme aplicação de percentuais previstos na Constituição sobre a receita bruta do IBS.
A reforma tributária da PEC 45/2019 e o IBS
Proposta pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP) e idealizada pelo Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), a PEC 45/2019 coloca o IBS como um tributo federal, a ser instituído por meio de lei complementar federal. A PEC propõe que o novo imposto faça a substituição de cinco tributos, são eles:
Na PEC 45/2019, a determinação da alíquota do imposto a ser cobrado é feita após cada ente federativo (município, estado, distrito e federação) fixar uma parcela da alíquota total do IBS, uma espécie de “sub-alíquota”, por meio de lei ordinária. Uma vez fixado o conjunto das “sub-alíquotas”, forma-se a alíquota única aplicável a todos os bens e serviços consumidos em ou destinados a cada um dos municípios/estados brasileiros.
Assim é criada a “alíquota de referência”, e dessa forma todos os bens e serviços destinados a determinado município/estado são taxados por uma mesma alíquota, mas a tributação não é uniforme em todo território nacional, pois cada ente federativo pode fixar sua alíquota.
Com relação à partilha da arrecadação, a PEC da Câmara detalha que cada ente federativo tem sua parcela na arrecadação do IBS determinada pela aplicação direta de sua “sub-alíquota”.
Concessão de benefícios fiscais
Em relação à concessão de benefícios fiscais, a PEC 110/2019 autoriza a concessão nas operações com alimentos (inclusive os destinados ao consumo animal); medicamentos; transporte público coletivo de passageiros urbano e de caráter urbano; bens do ativo imobilizado; saneamento básico; e educação infantil, ensino fundamental, médio e superior e educação profissional.
Já a reforma tributária da PEC 45/2019 não permite a concessão de nenhum benefício.
Ambos os textos preveem a possibilidade de devolução do imposto recolhido para contribuintes de baixa renda, nos termos de lei complementar.
Vinculação da arrecadação do IBS na reforma tributária
No texto da reforma tributária da PEC 110/2019, que está no Senado, o produto da arrecadação do imposto é vinculado às despesas e aos fundos constitucionais mediante aplicação de percentual sobre a arrecadação para definir a entrega direta de recursos ou piso mínimo de gastos com saúde e educação, por exemplo.
Já na PEC 45/2019, que tramita na Câmara, as destinações estão vinculadas a parcelas da sub-alíquota de cada ente federativo, fixadas em pontos percentuais e denominadas “alíquotas singulares”. A soma dessas alíquotas representa o valor a ser destinado pelo ente federativo para recursos voltados para saúde, fundos constitucionais, seguro-desemprego, BNDES, entre outros.
O que é o Imposto Seletivo?
O Imposto Seletivo é uma tributação específica sobre alguns bens e serviços, que se assemelha aos excise taxes. Esse tributo é complementar ao IBS.
A PEC 110/2019 define o Imposto Seletivo como um imposto arrecadatório, que será cobrado sobre operações com petróleo e seus derivados; combustíveis e lubrificantes de qualquer origem; gás natural; cigarros e outros produtos do fumo; energia elétrica; serviços de telecomunicações (referidos no art. 21, XI, da Constituição Federal); bebidas alcoólicas e não alcoólicas; e veículos automotores novos (terrestres, aquáticos e aéreos).
O texto da reforma tributária da PEC 45/2019 menciona que o Imposto Seletivo será de índole extrafiscal, com o objetivo de desestimular o consumo de determinados bens e serviços. Porém, ainda não há uma lista dos produtos ou serviços sobre os quais o tributo irá incidir. Caberá a uma lei ordinária ou medida provisória instituidora definir o que será tributado.
Outras matérias da reforma tributária
A reforma tributária prevista na PEC 110/2019 promove algumas outras mudanças não previstas no texto da PEC 45/2019. São elas:
- Extinção da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e incorporação ao Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ);
- Transferência de responsabilidade do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), da esfera estadual para a federal, com a arrecadação integralmente destinada aos municípios;
- Ampliação da base de incidência do Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor (IPVA), para incluir aeronaves e embarcações, com a arrecadação total destinada aos municípios;
- Criação de fundos estadual e municipal para reduzir a disparidade da receita per capita entre os estados e municípios, com recursos destinados a investimentos em infraestrutura;
- Autorização de criação de adicional do IBS para financiar a previdência social.
Como será a transição da reforma tributária das PEC 110 e PEC 45?
Caso a PEC 110/2019 seja aprovada, a transição acontecerá da seguinte maneira: durante um ano será cobrada uma contribuição “teste” de 1%, com a mesma base de incidência do IBS, e, depois, a transição dura cinco anos, sendo os atuais tributos substituídos pelos novos na proporção de 1/5 ao ano. Neste período, os entes federativos não podem alterar as alíquotas dos tributos a serem substituídos.
Já com a aprovação da PEC 45/2019 a transição será diferente. O texto diz que durante dois anos será cobrada uma contribuição “teste” de 1%, com a mesma base de incidência do IBS, e, depois, a transição dura oito anos, sendo os atuais tributos substituídos pelos novos na proporção de 1/8 ao ano. Neste período, os entes federativos podem alterar as alíquotas dos tributos a serem substituídos.
Transição da partilha de receitas
A reforma tributária da PEC 110/2019, que tramita no Senado, prevê que a transição será de quinze anos: cinco anos de transição para o novo imposto mais dez de transição das partilhas.
Sendo assim, a partir da criação dos novos impostos, cada ente federativo receberá parcela das receitas dos impostos novos de acordo com a participação que cada um teve na arrecadação dos tributos que estão sendo substituídos. Após a implementação definitiva da reforma tributária, a regra é progressivamente substituída pelo princípio do destino, à razão de um décimo ao ano.
A proposta da PEC 45/2019, que está na Câmara dos Deputados, prevê que a transição da reforma tributária será de cinquenta anos. Durante vinte anos a partir da criação dos novos impostos, os estados, o Distrito Federal e os municípios receberão (i) valor equivalente à redução de receitas do ICMS ou ISS, em virtude da extinção desses tributos; (ii) valor do aumento/diminuição da arrecadação em virtude de alterações das alíquotas de competência de cada ente federado e (iii) superávit/déficit de arrecadação após consideradas as duas parcelas anteriores, que será distribuído proporcionalmente pelas regras de partilha do novo IBS (princípio do destino mediante apuração do saldo de débitos e créditos).
A partir do vigésimo primeiro ano, a parcela equivalente à redução do ICMS e do ISS será reduzida em 1/30 avos ao ano, passando a receita a ser distribuída baseada no princípio do destino.
Órgão regulador e fiscalizador
A PEC 110/2019 propõe criar um órgão nacional (Super Fisco) composto pelos fiscos estaduais e municipais para gerir o novo imposto e fiscalizá-lo.
Já a PEC 45/2019 determina a criação de um Comitê Gestor Nacional, integrado por representantes da União, dos Estados e do Distrito Federal e dos Municípios. No entanto, o Comitê não terá atribuição fiscalizatória, que continuará com os fiscos dos entes federativos.
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