VEICULAÇÃO DE PROPAGANDA: ISS OU ICMS?
Problema antigo esse assunto que envolve serviços de propaganda e publicidade. Quando da aprovação da Lei Complementar n. 116/03, a Presidência vetou o subitem 17.07 da lista de serviços, que dizia: “Veiculação e divulgação de textos, desenhos e outros materiais de propaganda e publicidade, por qualquer meio”.
A justificativa do veto não convenceu: “O dispositivo em causa, por sua generalidade, permite, no limite, a incidência do ISS sobre, por exemplo, mídia impressa, que goza de imunidade constitucional (cf. alínea “d” do inciso VI do art. 150 da Constituição de 1988). Vale destacar que a legislação vigente excepciona – da incidência do ISS – a veiculação e divulgação de textos, desenhos e outros materiais de publicidade por meio de jornais, periódicos, rádio e televisão (cf. item 86 da Lista de Serviços anexa ao Decreto-Lei n. 406, de 31 de dezembro de 1968, com a redação da Lei Complementar n. 56, de 15 de dezembro de 1987), o que sugere ser vontade do projeto permitir uma hipótese de incidência inconstitucional. Assim, ter-se-ia, in casu, hipótese de incidência tributária inconstitucional (…)”.
Ora, vetar de forma ampla e irrestrita em razão da existência de algumas situações de imunidades, atinge o bom senso de qualquer intérprete da matéria. Na verdade, o que houve foi um forte lobby contra a aprovação do referido subitem da lista. Cabe lembrar que na lista de serviços anterior havia o item 86 (“Veiculação e divulgação de textos, desenhos e outros materiais de publicidade, por qualquer meio – exceto em jornais, periódicos, rádio e televisão)”. Com o veto, todas as veiculações de publicidade foram excluídas do ISS.
O pior, porém, foi a consequência do veto. Por acreditar que a não incidência do ISS provocaria, automaticamente, a tributação do ICMS sobre tais serviços, os Estados passaram a lançar o imposto estadual sobre tais atividades, a entender que veiculação e divulgação de publicidade são serviços de comunicação. Neste sentido, efetuaram cobrança de ICMS sobre serviços de outdoor, painéis, totens e veiculação de propaganda na internet, entre outros.
Outro erro crasso. O ICMS alcança prestação onerosa do serviço de comunicação, ou seja, quando “ocorre uma intermediação, havida por contrato, cujo objeto é a prestação de serviços de comunicação, na qual o emissor da mensagem contrata onerosamente um agente intermediário, para que este leve a sua mensagem ao receptor certo e determinado”, como ensina Edison Aurélio Corazza. No mesmo sentido, é o entendimento do ilustre jurista Roque Antonio Carrazza: “Adiantamos que não se confundem com os serviços de comunicação não podendo, destarte, ser tributados por meio de ICMS os serviços de propaganda, ainda que levados a efeito por empresas ligadas ao setor de comunicações. Afinal, o que se tributa por meio de ICMS são as prestações de serviços de comunicação, e não as prestações de quaisquer serviços por empresas de comunicação. Positivamente, a simples divulgação de propaganda e publicidade (por outdoors, banners, painéis, alto-falantes, emissoras de rádio, emissoras de televisão, internet, etc.) não tipifica prestação de serviço de comunicação, seja porque a empresa que a realiza não coloca à disposição de terceiros os meios e modos para que troquem mensagens, seja porque o destinatário não é identificado, seja, ainda, porque não interage com o emissor.” (in ICMS. Editora Malheiros. 14ª ed., 2009. p. 205).
Mesmo assim, as Fazendas Estaduais insistiram e insistem em cobrar ICMS de tais negócios. Ao mesmo tempo, os Municípios ficaram tolhidos de cobrar o ISS de veiculação e divulgação de publicidade, inclusive de outdoor.
Todavia, restava o subitem 17.06, este não vetado, a dizer: “Propaganda e publicidade, inclusive promoção de vendas, planejamento de campanhas ou sistemas de publicidade, elaboração de desenhos, textos e demais materiais publicitários”. Mas, não há dúvida de que o subitem 17.06 não trata de veiculação e divulgação. Refere-se, realmente, aos serviços de criação, elaboração, planejamento e execução de propaganda e publicidade. Uma empresa de propaganda e publicidade, em geral, é tomadora dos serviços de veiculação e divulgação. Ela contrata os veículos de divulgação, tanto veículos da mídia quanto outros veículos, do tipo outdoor.
Neste cenário confuso, o Superior Tribunal de Justiça assumiu a seguinte posição:
Superior Tribunal de Justiça:
3. Nos termos da jurisprudência do STJ, o critério para definição da incidência de ICMS ou ISS nestes casos não é a predominância da atividade desenvolvida, mas a lista de serviços expressamente previstos na Lei Complementar n. 116/2003. Se o serviço envolvido na operação estiver compreendido nessa lista, incide o ISS, caso contrário, incide o ICMS.
4. Embora não conste explicitamente do acórdão de origem que houve análise do contrato social da empresa a fundamentar a conclusão do julgado, bem como, o fato de não desempenhar a composição gráfica dos materiais publicitários, cuidando tão somente de alocá-los em outdoor, não desnatura a incidência do tributo, como entendido pela Corte de origem.
5. Observo que, quanto à inserção da atividade de veiculação e divulgação de materiais de publicidade (atividade da ora recorrente) no rol de serviços sujeitos ao ISS, a LC 116/03 traz em seus itens 10 (Serviços de intermediação e congêneres) e 10.08 (Agenciamento de publicidade e propaganda, inclusive o agenciamento de veiculação por quaisquer meios) – grifo nosso -; conceitos que, ainda que se entenda como taxativo o rol legal, comporta interpretação extensiva, a fim de abarcar serviços correlatos àqueles previstos expressamente, uma vez que, se assim não fosse, ter-se-ia, pela simples mudança de nomenclatura de um serviço, a incidência ou não do ISS.
6. O Tribunal a quo considerou, com análise das provas acostadas aos autos, que a atividade desenvolvida se subsome à descrição contida no item 17.06 do anexo da LC n. 116/03. Infirmar tal conclusão demandaria incursão no contexto fático-probatório dos autos, defeso em recurso especial, nos termos da Súmula 7 desta Corte de Justiça.
Embargos de declaração rejeitados.
(EDcl no AgRg no AREsp 464154/SP – Rel. Min. Humberto Martins – DJ 24/10/2014)
A Justiça começava a detonar a cobrança do ICMS em tais serviços. Em decorrência, vários Municípios deram início à cobrança do ISS dos serviços de veiculação de propaganda em outdoor e outras construções similares.
E agora, recentemente, o Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo, última instância administrativa da Secretaria da Fazenda do governo do Estado de São Paulo, derrubou a cobrança do ICMS sobre veiculação de propaganda na internet. O Google e o Facebook se livraram de autuações que somavam R$331,4 milhões (Google) e R$147,9 milhões (Facebook), segundo notícia do jornal Valor, de 20 de julho corrente.
A tese vitoriosa foi de que o veto do subitem 17.07 da lista de serviços da LC n. 116/03 não tem o condão de significar que tais serviços, como num passe de mágica, se transformem automaticamente em fatos geradores do ICMS. Afastado do ISS não vem a dizer que a lei o considere serviço de comunicação.
A questão, portanto, se resume agora ao ISS: os Municípios podem cobrar o imposto dos serviços de veiculação e divulgação de publicidade e propaganda? Bem, diversos Municípios estão aplicando o subitem 17.06 para justificar a cobrança. Outros se acautelam, pois entendem que o subitem 17.06 nada tem a ver com veiculação de propaganda.
A nossa posição coincide com a segunda. O subitem 17.06 não alcança os serviços de veiculação. Tanto é assim que havia outro subitem para tal atividade, o 17.07, que foi vetado. Já o subitem 10.08 trata de agenciamento (corretagem) de publicidade e propaganda, ou seja, dos serviços de intermediação, e não dos serviços de veiculação.
Ademais, a recente Lei Complementar n. 157/2016 reintroduz o serviço na lista, da seguinte forma:
“17.25 – Inserção de textos, desenhos e outros materiais de propaganda e publicidade, em qualquer meio (exceto em livros, jornais, periódicos e nas modalidades de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens de recepção livre e gratuita)”.
Desta forma, o nosso entendimento é de que somente depois de aprovada a nova lei municipal, com a inclusão do subitem 17.25, o Município poderá lançar e cobrar o ISS dos serviços de veiculação e divulgação de publicidade e propaganda, quando tal veiculação for de natureza onerosa.
Autor: Roberto A. Tauil – Editor Blogdoaftm.